Ser feliz ou ter razão? Eis a questão...
e o que aprendi ao fazer essa pergunta nos meus relacionamentos conflituosos
Tudo bem, essa pergunta já (quase) virou um clichê.
Mas eu te desafio a ir além e aplicar essa pergunta simples, objetiva e direta em questões que você considera difíceis e desafiadoras, especialmente nos relacionamentos.
Mas antes vou contar umas histórias a partir da minha experiência, quem sabe elas possam te ajudar a praticar o desafio proposto.
Vamonessa?
Quando a história nunca é com você
No passado, os problemas de relacionamento que eu tinha nunca eram meus. Eram sempre do outro. Meu indicador sempre apontava para ele ou ela. Eu queria estar sempre certo.
Isso criou uma espécie de inferno na minha vida.
Eu não enxergava a saída, estava preso naquele lugar onde culpar e julgar os outros é o esporte predileto. Não é nada bom estar nesse lugar, mas de vez em quando ainda volto nele.
Esse mecanismo básico da mente humana chama-se projeção. Eu projeto nos outros aquilo que eu não quero ver em mim mesmo. É uma espécie de mecanismo de defesa do ego.
Por exemplo: eu tinha (tenho, porque as vezes ele ainda aparece) um traço de arrogância que sempre foi muito difícil de lidar, porque eu não admitia que era comigo. Isso se refletia na minha relação com o poder. Eu criticava e julgava os “mais poderosos” e maltratava os “menos poderosos.”
Eu não gostava desse traço em mim, mas não sabia como me livrar dele.
Quantas vezes não fui rude com as palavras com um garçom, por não ser atendido da forma que eu gostaria? Muitas. Já senti muita vergonha desse comportamento.
E quantas vezes não tive problemas de relacionamento com superiores, seja no trabalho ou na comunidade.
Ambas as situações mostram um desequilíbrio, uma necessidade de estar certo, de ter razão.
E por mais que eu estivesse certo em algumas situações, a sensação final era sempre de um incômodo, sinal de algo dentro de mim que não estava bem.
Mesmo assim, continuava julgando e atacando qualquer um que ousasse não fazer o que eu queria, ou vice-versa.
Quando você percebe que a história é com você
Um dia, em um workshop da cura das atitudes, ouvi essa frase: “Você quer ser feliz ou ter razão?”. As duas coisas ao mesmo tempo não tem jeito, ou é uma ou é outra, o professor falou.
Quando ouvi isso deu um “tilt” interno, e todos os meus antigos conceitos foram chacoalhados.
Daí resolvi aplicar essa simples pergunta ao relacionamento com meu pai, que nessa época era péssimo.
Ele era alcóolatra, e uma das coisas que eu sempre fazia era pedir para ele parar de beber. Por mais que eu pedisse, ele nunca parou.
Quem mais sofria com isso? Claro, eu!
Ficava remoendo pensamentos tipo: “Será que ele não percebe que beber assim estraga a sua saúde?” Apesar de dizer que eu sabia como era o vício do álcool, na prática, com o meu pai, apliquei o conhecimento ao contrário.
Ou seja, eu estava totalmente equivocado. Quando percebi, e principalmente me dei conta de que isso estava fazendo mal para mim mesmo, mudei de atitude. Isso aconteceu quando eu tinha uns 34 anos.
Comecei a aceitá-lo do jeito que ele era, e parei de pedir para ele parar de beber.
Que desafio foi esse! Me levou ao limite várias vezes.
No princípio era algo impensável. Vinha uma voz e dizia: “Mas como você vai aceitar ele do jeito que ele é, sendo que ele te fez tanto mal até agora, sendo um pai ausente e alcoólatra?”
Eu me fazia de surdo e dizia prá ele: “Você é o melhor pai do mundo. Obrigado por possibilitar que eu esteja aqui.” Ele ficava meio embaraçado se estivesse sóbrio, mas me abraçava e beijava se estivesse meio alto. Aquilo que eu mais temia (ele ficar bêbado) estava sendo uma fonte de felicidade para mim.
E a voz vinha e dizia novamente, e de novo, e de novo, várias vezes ao dia: “Como ele pode ser o melhor pai do mundo, se ele te causou tanto mal?”
Eu continuei firme aceitando-o como ele era, sem dar conselhos e agradecendo. As vozes negativas na minha cabeça foram se aquietando, ficando bem baixinhas. Uma das últimas foi: “Salve seu pai do alcoolismo, se ele continuar assim ele vai morrer.”
Eu sabia que não podia mudá-lo, e muito menos demovê-lo do vício, simplesmente porque ele não queria. Por algum motivo, ele queria levar a vida daquela forma.
Não demorou muito ele faleceu, por causa de complicações do vício.
O tempo que passamos juntos a partir do momento em que comecei a aceitá-lo completamente foi o melhor período que tivemos juntos.
Fiquei pensando no que teria acontecido se eu mantivesse minha posição teimosa de querer mudá-lo, salvá-lo do alcoolismo. Com certeza eu não teria esse período amoroso com ele. Seria só conflito.
Isso me fez lembrar outra história.
Uma vez em um dos grupos da cura das atitudes ouvi uma mãe dizer que estava muito cansada de tentar salvar o filho viciado em crack. Há anos ela corria de clínica em clínica, tentando tudo o que podia.
Ele passava períodos livre de drogas mas sempre recaía, para depois repetir o ciclo. E a mãe fazendo de tudo para salvar o filho.
Mas mesmo um coração de mãe cheio de amor incondicional não conseguiu salvá-lo.
Naquele dia, ela contou que havia chegado ao seu limite, depois de anos tentando. Nessa luta, ela estava esquecendo de si mesma. Queria estar certa de que conseguiria salvar o filho, mas a realidade é a grande professora, e a ensinou que isso não estava acontecendo.
Abatida, cansada, triste e deprimida, ela fez uma declaração de independência. A partir daquele momento estava desistindo de salvar o filho, e iria cuidar de si.
"Seja seletivo em suas batalhas. Às vezes, ter paz é melhor do que estar certo."
Sabedoria popular
Disse que estaria perto do filho sempre que ele precisasse, para dar apoio e amor, mas que não mais se anularia para salvá-lo das drogas.
Uma declaração poderosa que pode ter trazido alívio para o coração dessa mãe. Nunca soube como essa história acabou.
Tanto a minha história quanto a dessa mãe ilustram, na minha visão, que é impossível ter razão e ser feliz ao mesmo tempo.
No entanto, você pode discordar, acreditando que é perfeitamente possível conciliar os dois.
Não deixa de ser verdade, em algumas situações.
Porém, para ir mais fundo, tenho que falar sobre felicidade.
Felicidade genuína, a fonte do bem-estar duradouro
O que é a felicidade genuína, verdadeira?
Olha só como o Dalai Lama define esse tipo de felicidade:
um estado profundo de bem-estar mental e emocional, cultivado através da compaixão, do altruísmo e do treinamento da mente.
Desafiador, não?
Fazer essas três coisas exige um compromisso forte em querer conhecer a si mesmo.
A felicidade genuína não é um objetivo a ser alcançado, uma meta a ser atingida. Ela é o despertar de um estado potencial em nós, que é o estado de completude, de interconexão com tudo e todos.
Ela está disponível a qualquer momento, em qualquer situação.
Mas cuidado! Ela pode ser falsificada.
Algumas vezes respondemos com um sonoro “escolho ser feliz nessa situação”, mas não nos damos conta que essa felicidade é passageira. Estamos nos auto enganando.
Temos que estar muito atentos aos pensamentos para separar a felicidade genuína da felicidade do ego.
A vida moderna nos viciou na busca da felicidade rápida, com todas as suas ofertas de consumo que prometem prazer a qualquer custo.
Não precisamos mais nos enganar. Estamos fartos de tentar ser felizes de fora para dentro. Isso não funciona!
O caminho da felicidade genuína é de dentro para fora.
Então bora praticar o que o Dalai Lama sugere: ser compassivo, altruísta e acima de tudo treinar a mente (você vai ouvir falar muito disso por aqui).
A fórmula perfeita para o conflito: eu tenho razão e pronto!
Vem cá, você acha mesmo possível ser feliz e ter razão ao mesmo tempo?
Na minha experiência é impossível, porque o fato de você ter razão exclui a possibilidade de uma opinião ou sentimento diferentes, criando mais separação e ficando do lado oposto da felicidade.
Em um debate, onde prevalece um diálogo baseado em fatos sobre um determinado assunto, em muitos casos posso dizer que tenho razão, e provar o porque baseado em números e dados.
Já num relacionamento onde questões emocionais estão envolvidas, ficar na posição fixa de “eu tenho razão” pode gerar mais separação, dor e sofrimento, pelo simples motivo de que ela fecha a porta do diálogo.
Por exemplo, minha teimosia em querer mudar o comportamento do meu pai com relação ao álcool me separava dele. Eu mais brigava do que me conectava amorosamente com ele.
Eu tinha razão naquilo que estava falando, pois é fato comprovado que o álcool faz mal para a saúde, e o melhor era ele parar.
Mas a realidade me mostrou que ele não queria parar, e isso me fez sofrer.
Assim como a mãe que estava tentando salvar o filho das drogas não era.
E você? Em quantas situações da sua vida hoje você age baseado no fato de que “tem razão”?
A resposta a essa pergunta pode mostrar muito sobre você, dando muitos insights, iluminando o seu caminho e permitindo ver as situações de uma nova maneira.
Lembre que dentro da nossa mente existe uma parte inconsciente que determina muito do nosso comportamento. Avaliar se estamos na posição de “estar certos” nos ajuda a trazer conteúdos que estão debaixo do tapete. Esteja aberto para isso.
Uma coisa é certa: observe seu comportamento e como você age e pensa à respeito das outras pessoas. Isto te dará pistas de inestimável valor.
Pode ser que você encontre na sua mente aquele pensamento que deseja ardentemente que o outro mude, de preferência do seu jeito.
Falta de diálogo: o drama do mundo hoje
A maioria dos problemas que vemos hoje entre países, cidades, comunidades, instituições, famílias e pessoas é a falta de diálogo. Ninguém escuta, todos querem ter razão. Por isso tanta guerra, disputa e infelicidade.
A polarização amplificada pelas redes sociais está se refletindo rapidamente nas famílias, criando mais separação. Ao invés de resolver as diferenças familiares através de uma boa conversa, onde todos falam e escutam, alguns se protegem atrás da posição “eu tenho razão”.
Você também nota, como eu, que estamos perdendo a capacidade de escutar e conversar?
Um diálogo pressupõe fala tranquila e escuta empática. Ambos têm o silêncio como pré-requisito.
Estamos perdendo nossa capacidade de falar tranquilamente e escutar de forma atenciosa porque nossa vida está muito barulhenta, e o silêncio está ficando cada vez mais escasso.
“A condição básica para sermos capazes de escutar o chamado da beleza - e responder a ele - é o silêncio. Se não temos silêncio dentro de nós mesmos - se nossas mentes e corpos estão repletos de barulho -, não somos capazes de ouvir o chamado da beleza”.
Thich Nhat Hanh
Quando perguntamos: “Quero ser feliz ou ter razão?” numa determinada circunstância, e aguardamos a resposta, abrimos um espaço de silêncio dentro de nós.
Isso cria as condições para que se estabeleça o diálogo para resolver um conflito, seja entre duas pessoas, na família, na comunidade ou entre países.
Aí está a esperança para um mundo mais harmonioso para nós e nossas crianças.
E a boa notícia é que você e eu podemos fazer a diferença aqui e agora!
Basta lembrar que podemos desistir da necessidade de estarmos sempre certos.
A prática de se questionar
No turbilhão de pensamentos que passam pela nossa mente todos os dias, 24x7, precisamos fazer algumas pausas mentais para criar silêncio e fazer as perguntas certas.
Você pode perguntar “você quer ser feliz ou ter razão?” em toda e qualquer situação que gere estresse para você. Tenho certeza que com o mundo em que vivemos hoje, não lhe faltarão oportunidades de fazê-la.
E quando você a fizer naquela situação específica, estará praticando a escolha consciente. Isso vai te dar mais clareza para sempre que possível escolher pela felicidade genuína.
Porém, se responder “tenho razão e pronto!” está tudo certo. Sempre temos a oportunidade de escolher novamente.
Nós somos assim, temos as duas polaridades dentro de nós.
“Qualquer árvore que queira tocar o céu precisa ter raízes tão profundas a ponto de tocar o inferno.”
Carl G. Jung
Integrá-las faz parte da jornada do guerreiro.
Aceitando o desafio
Se você aceitar o desafio e começar a se perguntar a cada relacionamento conflituoso:
Eu quero ser feliz ou ter razão na situação (especifique)?
Terá a chance de criar novas conexões neurais que aos poucos vão abrindo as portas para uma percepção mais apurada, trazendo mais harmonia e paz interior para a sua vida.
Ficando comigo por aqui você receberá um conteúdo rico em conceitos e dicas práticas para prosseguir na sua jornada despertando a felicidade genuína.
Com Amor,
Luiz Pontes
PS: Vou amar receber seu feedback. Estou começando e é sempre bom saber se meus leitores estão gostando.
Porque você deveria assinar Uma Vida Plena
Porque:
Vai agregar um valor inestimável a sua vida como ela está agora;
Vai refrescar a dureza do seu dia a dia com mensagens, práticas, vivências e conceitos que vão te fazer pensar, sentir e agir de forma diferente;
Será um apoio e suporte nos apuros emocionais da vida;
É uma “ponte” que vai te ligar a pessoas com a mesma “vibe”;
Não custa nada, apenas um clique.
Experiência de leitura no aplicativo
Cada novo post é enviado diretamente para a sua caixa de email a partir do momento em que você assina a newsletter.
No entanto, se você preferir ler no celular e se beneficiar de outros recursos como seguir outros escritores, descobrir novas newsletters e interagir através do feed de notas, acessando áudio e vídeo, pode instalar o aplicativo do Substack clicando aqui.
Para saber mais sobre a plataforma de tecnologia que alimenta esta publicação, visite Substack.com.