Cura das Atitudes: A Saga de um Médico em Busca de si Mesmo
e todas as consequências do bem que frutificaram a partir da sua transformação interior
“Doutor, o que é morrer?”, o menino perguntou para o seu oncologista.
Esta não é uma pergunta simples de se responder, especialmente quando feita por uma criança de 8 anos, com câncer terminal.
O médico não respondeu, e mudou de assunto.
Jerry, um psiquiatra que estava na sala e presenciou a cena, acha estranho o fato do doutor mudar de assunto. Pesquisando, descobre que não é uma atitude comum. E mais, descobre que crianças nessa situação abrem o coração para pessoas em quem possam confiar e que lhe darão respostas honestas (depois ele soube que a “tia” da limpeza de uma determinada ala representava esse papel para as crianças).
Essa cena aconteceu em Outubro de 1975, em um hospital da Califórnia.
Jerry não sabia, mas nesse dia ele embarcou em uma jornada que inspirou profundamente milhares de seres humanos ao redor do mundo, eu e a Rita incluídos.
Essa é a história do “Center for Attitudinal Healing” (Centro para Cura das Atitudes), nos EUA e no Brasil, e de como isso afetou de forma muito marcante a minha vida. Vem comigo!
O começo de tudo
Os acontecimentos que antecederam Maio de 1975 funcionaram como catalisadores para a transformação que viria a ocorrer a partir daquele momento na vida do Dr. Gerald Jampolsky, que a partir de agora chamarei de Jerry.
Ele estava separado da primeira mulher, às voltas com o alcoolismo e num relacionamento tóxico. O resultado: mergulhou no sentimento de rejeição e vitimismo.
No limite de sofrimento, Jerry recebeu através de uma amiga querida o convite para conhecer o livro “Um Curso em Milagres”1 (que a partir de agora me refiro como UCEM). Quem sabe não poderia ajudá-lo?
UCEM naquele momento era um manuscrito e estava começando a se tornar conhecido. Segundo Jerry, ele “funcionava como uma ferramenta para a minha transformação espiritual”. Foi um divisor de águas na sua vida.
Não foi um empreendimento fácil. UCEM não é um livro fácil. Mas Jerry foi persistente, e apesar de todas as dificuldades continuou lendo e praticando os exercícios, que basicamente propunham que ele olhasse para dentro de si e reconhecesse a sua própria essência - o amor.
Num determinado momento, para seu espanto, ouviu uma voz interior dizendo:
“Médico, cura-te a ti mesmo”.2
O resultado foi que ele começou a ver a vida a partir de uma perspectiva mais simples, e ao mesmo tempo muito mais profunda.
“Comecei a ver que não eram as outras pessoas ou circunstâncias do mundo que me perturbavam; percebi que meus pensamentos eram a causa da minha perturbação.”3
Então, em Julho de 1975, em plena batalha com o alcoolismo, ele teve uma experiência impactante. Apesar de já ter tido várias conquistas com os exercícios psicoespirituais de UCEM, ele continuava dividido - com uma parte de si mesmo sabendo que poderia vencer o vício e a outra ainda cedendo a tentação.
Vivendo essa cisão interna e bastante aborrecido com isso, pediu ajuda a Deus.
Uma noite, acordou de madrugada suando frio e com muito medo. Foi quando ouviu uma voz que vinha do interior da sua cabeça: “Você não precisa mais beber, você está entrando em uma nova fase de cura”. Ele ouviu essa sentença três vezes.
No dia seguinte, esqueceu-se de tudo, e, quando fez menção de pegar a garrafa de uísque para começar a beber, ouviu a voz novamente, e com as mesmas três repetições.
Nunca mais ele bebeu!
Nos meses que se seguiram, Jerry experimentava cada vez mais momentos de paz interior, à medida em que se empenhava nos exercícios espirituais.
Foi então que, no mês de Outubro de 1975…
Grupos de Suporte - o coração da cura das atitudes
Ele presenciou aquela cena que eu contei lá em cima.
Nesse momento, Jerry soube com todo o seu ser que ele precisava ajudar aquela criança, e todas as crianças que estivessem na mesma situação.
Afinal, quem está pronto para dialogar com uma criança com câncer terminal, que sabe que vai morrer?
Jerry abriu-se para a experiência de ajudar, e sentiu que essas crianças precisavam de um lugar seguro para se expressar, falar dos seus medos e sentimentos mais profundos, compartilhando experiências comuns entre eles.
Uns dias após o evento no hospital, ele estava no avião voando de Nova York de volta para casa na Califórnia e conta a seguinte história:
“Estou percebendo que quando pedimos orientação interior e sinceramente desejamos ser atendidos, devemos dar um tempo e ouvir, pois essa resposta certamente virá. Durante esse voo de volta para casa recebi uma extensa mensagem, transmitindo-me um objetivo e propósito que modificaram a minha vida por completo. A informação foi apresentada para mim de um modo bem semelhante a um ditado interior”.4
Ali nascia o embrião do primeiro “Center for Attitudinal Healing” (Centro para Cura das Atitudes), que foi para Jerry um bálsamo, o elemento que veio coroar a cura do alcoolismo e sua obsessão em morrer.
Junto com três amigas, ele alugou uma sala ao lado de seu consultório e começou o grupo com seis crianças. O grupo foi um sucesso, não só para as crianças, mas também para os adultos, que descobriram um lugar onde eles mesmos podiam expor seus medos.
Pense que grande desafio não deve ter sido para o Jerry, que tinha obsessão em morrer!
Logo outras crianças surgiam com a mesma necessidade, e os grupos foram se multiplicando, passando também a atender adultos. Surgiram grupos para apoiar os pais em luto por seus filhos que morriam, pessoas envolvidas em vícios, relacionamentos tóxicos, etc. e pessoas em crise de qualquer natureza, mental ou física.
No fundo, um grupo de suporte da cura das atitudes recria um ambiente no qual nossos ancestrais celebravam suas alegrias e diferenças - ao redor da fogueira.
Em que situações você pode falar abertamente sobre suas dores, sofrimentos e medos sem ser julgado? Os grupos criam o momento onde isso é possível.
Você aprende a falar - na hora certa e com o tom apropriado. Também aprende a ouvir, ou melhor, escutar, que é a mesma coisa de ouvir com atenção plena. Você não imagina a riqueza que é explorar isso dentro.
E uma das coisas que mais me encantou - a de que somos todos iguais! Jerry recebeu de seu mestre interior que os grupos deveriam ser conduzidos por voluntários, e que todos, independente de sua posição na sociedade, devem deixar o “crachá” do lado de fora da sala.
Assim, se faz verdade o princípio #9 - “Somos alunos e professores uns dos outros.”
Mas um grupo sem uma direção mínima fica desgovernado, e isso não é bom. Um “contrato” mínimo deve ser celebrado entre todos os participantes.
Sentindo essa necessidade com o passar dos anos, Jerry e os voluntários do Centro criaram as “diretrizes para os grupos de cura das atitudes”.
Estabelecendo as diretrizes para os grupos
Essas diretrizes são lidas antes do início das reuniões, para lembrar o compromisso de cada participante enquanto no grupo. São dez diretrizes, escritas de forma simples e direta, que guiam o nosso comportamento dentro da dinâmica das reuniões do grupo.
As diretrizes para os grupos foram desenvolvidas para construir um lugar seguro. Se você sente que uma diretriz não está sendo seguida, sinta-se à vontade para falar.
A meta do grupo é utilizar os princípios para cura das atitudes como ferramentas para aprender o perdão e escolher a paz interior.
Reconhecemos nos grupos que o amor é escutar, e concordamos em escutar com um coração aberto, para dar suporte mútuo e para praticar o compartilhar e o ouvir não julgando.
Estamos aqui para curarmos a nós mesmos. Não estamos aqui para dar conselhos ou para mudar as crenças ou o comportamento de ninguém. Ser aceitos como somos torna mais fácil para aceitarmos os outros.
Compartilhamos da nossa própria experiência. Expondo o nosso estado emocional, compartilhamos experiências comuns que nos unem.
Respeitamos a nós mesmos e aos outros como únicos, aceitamos que o processo de cada um pode ser diferente do nosso e o reconhecemos como importante, e não o nosso julgamento dele.
Estamos aqui para apoiar a orientação interior de cada um e ajudar uns aos outros a encontrar as melhores respostas.
Os papéis de estudante e professor são intercambiáveis. Eles fluem de um para o outro independentemente da idade ou da experiência.
Praticamos estar presentes com os outros, vendo cada pessoa como um ser completo, sem defini-los por sua aparência, humor, comportamento ou circunstância.
Concordamos em manter em mente que sempre podemos escolher entre a paz ou o conflito, entre o Amor ou o medo.
Reconhecemos a confidencialidade do que compartilhamos em grupo, reconhecendo que isto é importante para manter o grupo como um local de segurança e verdade.
PARA GRUPOS ON LINE (introduzidos muito recentemente)
11. Concordamos que estaremos presentes de forma autêntica em reuniões de grupos on-line, mantendo a atenção, o silêncio e a privacidade necessárias.
Essas poucas diretrizes orientam o andamento da reunião, e a diferenciam de outras abordagens psicoterapêuticas de grupo.
Mas além de diretrizes, os grupos de suporte precisavam de princípios.
E foi aí que Jerry nos deu o grande presente da cura das atitudes - os 12 princípios.
Os 12 Princípios para Cura das Atitudes
Princípios elevados nos guiam através da vida. Funcionam como uma bússola. Todas as vezes que nos perdemos, e sabemos e reconhecemos que estamos perdidos, certos tipos de princípios podem nos ajudar a reencontrar o caminho.
Considero que hoje os únicos princípios que valem a pena ser seguidos são os princípios espirituais. Princípios que ligam nosso mundo interior com o Grande Mistério.
Os 12 princípios da cura das atitudes são princípios psicoespirituais. Eles nos ajudam a “aterrar” a experiência espiritual na nossa psique e comportamento.
A origem dos 12 princípios é o UCEM. Naturalmente, pelo impacto que os exercícios do Curso causaram em sua vida, Jerry foi beber “na Fonte”.
O que ainda não contei era que o Jerry era disléxico. Confundia “dog” com “god”. Por causa disso, buscava sempre simplificar as coisas para entender melhor. UCEM é um livro denso e difícil de ler, mas ele teve presença para “pinçar” de lá o essencial, que fala para o coração de todos, um tipo de linguagem neutra.
Em Maio de 2006, trouxemos Jerry para o Brasil, e tivemos a honra de levá-lo a vários lugares em SP e Brasília. Conversamos muito, e num determinado momento fiz a pergunta que tanto queria: “Jerry, como surgiram os 12 princípios?”
Com a objetividade de sempre, contou que simplesmente pediu orientação ao seu mestre interior e foi abrindo o UCEM em páginas aleatórias, e pegando frases onde colocava os olhos. Essas frases se tornariam os princípios.
Eu achei isso simplesmente incrível, porque desde o início, quando conheci a cura das atitudes, lá em 1998, os princípios eram algo que eu considerava tipo “de outro planeta”.
Quem teria presença e sabedoria suficientes para sintetizar de forma tão brilhante 12 princípios que cobrem todos os pontos mais importantes da vida?
E prá você não ficar muito curioso, seguem os princípios:
A essência do nosso ser é amor.
Saúde é paz interior. Curar é abandonar o medo.
Dar e receber são a mesma coisa.
Podemos nos desprender do passado e do futuro.
O agora é o único tempo que existe, e cada instante é para nos doarmos.
Podemos aprender a amar a nós mesmos e aos outros perdoando, ao invés de julgando.
Podemos nos transformar em pessoas que veem o amor e o que une, em lugar de pessoas que veem o erro e o que desune.
Podemos escolher nos direcionar para a paz interior, independente do que está acontecendo no exterior.
Somos alunos e professores uns dos outros.
Podemos nos concentrar na totalidade da vida e não nos seus fragmentos.
Sendo o Amor eterno, não existe razão para temer a dor e a morte.
Podemos sempre ver a nós mesmos e aos outros como seres que ou oferecem amor ou suplicam ajuda.
Juntos, esses 12 princípios e as diretrizes formaram a base para que os grupos de suporte mútuo florescessem por todo o mundo.
Eles cresceram tanto que…
O Impacto Global da Cura das Atitudes
Em 1979 Jerry foi convidado por um apresentador muito famoso na época nos EUA, Phil Donahue, para aparecer em seu Talk Show junto com as crianças do Centro.
Isso alavancou a mensagem da cura das atitudes, e fez com que Jerry fosse entrevistado em centenas de outros programas, incluindo a Oprah Winfrey (onde ele é responsável, ali ao vivo, por um “a-ha moment” da Oprah).
Em 1981 encontra sua companheira de vida, Diane Cirincione, e com ela percorre o mundo espalhando a mensagem da cura das atitudes. Passa a escrever, e publica inúmeros livros, com destaque para “Love is Letting Go Of Fear” (Amar é Libertar-se do Medo), que orgulhosamente publicamos no Brasil.
Faz sua passagem no dia 29 de Dezembro de 2020, as 95 anos, de forma pacífica em sua casa flutuante em Sausalito, Califórnia (casa em que eu e a Rita tivemos o privilégio de estar com eles).
Hoje existem Centros para Cura das Atitudes em muitos lugares do mundo.
Nós, eu e Rita e um grupo de amigos, fundamos o Centro para Cura das Atitudes no Brasil em 1998. Mas essa história fica para a Parte 2, na próxima semana.
AIDS e a Cura das Atitudes
No início da década de 80 a AIDS atingia números alarmantes, sendo ao mesmo tempo uma epidemia e uma pandemia. A taxa de sobrevivência era muito baixa. Hoje em dia praticamente esquecemos disso, porque felizmente encontramos formas de lidar com a AIDS.
Nessa época o Center for Attitudinal Healing criou uma campanha junto com um cartunista chamado Jack Keeler. Era uma linha telefônica exclusiva para crianças, que as ajudava no difícil processo de lidar com a doença.
Jack criou um cartaz que, nas palavras de hoje, viralizou. Fez tanto sucesso que está hoje no “New York City AIDS Memorial”, um memorial em homenagem aos 100.000 cidadãos da cidade mortos pela epidemia nos anos 80.
Diz o cartaz: “Eu tenho Aids. Por favor me abrace. Eu não vou te deixar doente”.

Ele foi distribuído pela OMS para 142 países em sua Campanha de Educação sobre a AIDS em 1987 e, posteriormente, adotada como seu símbolo global mais eficaz para a AIDS em 2005. Jerry e Diane viajaram para mais de 30 países para promover a campanha e o cartaz.
Gostou da história? Te inspirou de alguma forma? Clica no botão abaixo e deixa um comentário. Vou adorar saber o que você achou.
Na Parte 2 eu contarei a nossa história (Rita e eu) com a cura das atitudes aqui no Brasil.
Com Amor,
Luiz Pontes
🎁Porque você deveria assinar Uma Vida Plena
Pra cultivar mais paz interior no meio do caos;
Pra lembrar que tem escolha, mesmo quando parece que não;
Pra receber muita informação relevante sobre som & música;
Pra sentir que você não está só nesse caminho;
Pra receber textos que tocam fundo, de forma simples e prática;
E porque é gratuito — chega toda quinta cedinho na sua caixa de entrada.
Caso queira falar comigo, envia um e-mail para contato@luripontes.com.br .
Clique aqui para meu perfil no Instagram e aqui para o Linkedin.
Mantenha-se atualizado
Nunca perca uma atualização — cada novo post é enviado diretamente para a sua caixa de email. Para uma experiência de leitura livre de spam e anúncios, além de recursos de áudio e comunidade, obtenha o App Substack clicando aqui.
Para saber mais sobre a plataforma de tecnologia que alimenta esta publicação, visite Substack.com.
REFERÊNCIAS
Um Curso em Milagres - Foundation for Inner Peace. É um tratado de psicoespiritualidade prática, não religiosa e não dogmática, escrito na forma de “ditado” por uma psicóloga ateia americana na década de 1960, traduzido para o Português por Lilian Paes. Editado no Brasil pela Editora Allievo. Helen Schucman, a psicóloga que transcreveu o “ditado”, não se considera autora do Curso.
Jampolsky, Gerald G. - Ensine Somente Amor pg 19 - Editora Objetiva
Jampolsky, Gerald G. - Vivendo o Amor pg 70 - Editora Objetiva
Jampolsky, Gerald G. - Vivendo o Amor pg 102 - Editora Objetiva